Friday 29 January 2010

[35] Alvorada

No dia seguinte, ou melhor, depois do festim que durou não se sabe quanto, nada sobrou inteiro entre os destroços para além de uma sementeira de corpos moles e dormentes que foram abrindo os olhos depois de um sono lento e longo ou talvez de um sonambulismo lamacento, não se sabe ao certo. Ninguém sabe também quanto durou aquela cerimónia sumária que foi o sacrifício do porco dos túneis.
O cigano abre os olhos e nada vê senão sangue suor e trapos - pelos vistos o festim foi real - pensou. Olhou à sua volta e confirmou que todos os colegas de viagem estão presentes, alguns ainda inconscientes e outros a acordar. A cabeça doía-lhe, na boca residia um sabor sem alma misturado com ressaca talvez devido à carne do monstro que comeram avidamente.

Javier também estava deitado. Abriu os olhos e depois de assim permanecer meia hora levantou-se a custo e arrastou-se por ali sem direcção, apenas para mostrar ao destino que se mantinha vivo, tal um bêbado cambaleante tentando não dar parte fraca.

Assim todos foram acordando, uns nus outros esfarrapados. Proscritos, sentiam-se agora expulsos de um paraíso obscuro não sabendo à partida se aquele seu estado se devia a um devaneio sexual se a uma batalha contra quatrocentas bruxas.

Hora de levantar, olharam de volta para os destroços da festa.
"O que restará da besta?" "Haverá ossos por aí ou até esses nós roemos?"

Deambularam por ali à procura dos rastos e restos do evento, nem uma presa ensanguentada do monstro sobrou, apenas algumas peças de roupa espalhadas e, espera aí, o que é aquilo ali à frente?
É apenas um trapo rasgado e ensanguentado com um número estampado... 21...
O porco dos túneis que antes derrotaram, esquartejaram e comeram não era senão o camisola 21, esse defesa franzino de um clube extinto de futebol, depois companheiro e finalmente ex-companheiro destes canibais dos túneis. O seu nome era Darrel Bubb.

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